Projeto de pesquisa coordenado por Marcelo R. S. Ribeiro e desenvolvido entre 2020 e 2023 na Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia.
Resumo
Considerando a questão do arquivo na história dos meios e das formas artístico-culturais audiovisuais como um problema duplo, que concerne tanto aos modos de arquivamento (e apagamento) de traços e rastros, quanto às relações variáveis estabelecidas com o que foi previamente arquivado, este projeto aborda diferentes modalidades de relações críticas e inventivas estabelecidas com o arquivo colonial-moderno, composto por registros de figuras de alteridade e diferença (humana ou não humana). Pretende-se diferenciar as principais abordagens críticas e transbordamentos inventivos que tornam possível reconstituir histórias reprimidas, elaborar memórias silenciadas e imaginar futuros interrompidos, por meio da perturbação do arquivo como ordem informacional fundada em uma série de apagamentos, de modo a evidenciar e confrontar a violência anarquívica que funda o arquivo. Para analisar o paradigma anarquívico, entendido como conjunto de abordagens críticas e transbordamentos inventivos do arquivo colonial-moderno, propõe-se o desenvolvimento da arqueologia do sensível como abordagem metodológica, em diálogo com a arqueologia crítica da imagem e com a arqueologia das mídias (no campo interdisciplinar em que a área de Cinema e Audiovisual pode ser situada, entre Artes e Comunicação), assim como com as reivindicações da arqueologia na filosofia e nas ciências humanas (na arqueologia dos saberes, enunciados e discursos). Para elaborar essa arqueologia do paradigma anarquívico, a pesquisa assume como seu ponto de partida o estudo do Programa Memória do Mundo (Unesco), como metonímia das políticas da memória e das disputas pela configuração e arquivamento do mundo como mundo comum. Investiga-se como as mídias cinematográficas e audiovisuais e o arquivo colonial-moderno participam da iniciativa da Unesco de constituir um arquivo universal da humanidade e do mundo, herdeira de um projeto moderno que remonta ao modelo enciclopédico e se desdobra, atualmente, em torno de problemas como dataficação, cultura algorítmica etc., que também se tornam objetos do paradigma anarquívico. O reconhecimento de que a história contemporânea do Programa Memória do Mundo remonta a uma genealogia moderna conduz a pesquisa a se desdobrar em três momentos analíticos suplementares: o momento em torno do eixo do terror, relacionado ao reconhecimento da violência colonial, em geral, e do trauma da escravidão atlântica, em particular, como constitutivos da modernidade; o momento em torno do eixo do imaginário, decorrente da densidade das figurações de diferença e alteridade sob signos como “índios”, “negros”, “diversidade cultural” etc., no interior da consciência planetária desenvolvida na história da modernidade, entre exotismo, arte e etnografia; e o momento em torno do eixo da extração, vinculado à centralidade da relação extrativista com a “natureza” na definição da economia política moderna. Em todos os momentos indicados, considerando as condições discursivas e midiáticas de diferentes modalidades de relações críticas e inventivas estabelecidas, em diferentes produtos, processos e experiências cinematográficas e audiovisuais, com o arquivo colonial-moderno e a violência fundante que o constitui, a elaboração dessa arqueologia do paradigma anarquívico pretende compreender as configurações estéticas singulares que caracterizam as abordagens críticas e os transbordamentos inventivos nos quais, segundo a hipótese central da pesquisa, a violência fundante do arquivo é duplicada, devolvida e redistribuída.
Equipe
- Marcelo Rodrigues Souza Ribeiro – Coordenador
- Kalinka Brant da Silva – Integrante (PPGCI-UFBA – mestrado)
- Mateus Costa de Oliveira – Integrante (Póscom – mestrado)
- Marina Moreno Baqueiro de Souza – Integrante (graduação)
- João Guilherme Batista Cardoso – Integrante (graduação)
Projetos relacionados
Cinema e audiovisual na Memória do Mundo (Unesco): tecnologias da comunicação e informação, cosmotécnicas e políticas da memória (Graduação – PIBIC UFBA 2021-2022)
Inserindo-se no âmbito do projeto de pesquisa O paradigma anarquívico e o arquivo colonial-moderno no cinema e no audiovisual, iniciado em 2020 e atualmente em desenvolvimento, este projeto de pesquisa propõe uma abordagem multidisciplinar e interdisciplinar do Programa Memória do Mundo, instituído pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) em 1992, que deve ser reconhecido como uma das principais formas contemporâneas de atualização da aspiração moderna ao arquivamento do mundo. Nessa abordagem, caracterizada pela articulação entre (a) uma interrogação teórico-filosófica do conceito de “memória do mundo” que intitula o programa da Unesco, (b) um estudo sócio-antropológico dos problemas das tecnologias da comunicação e informação, em especial o cinema e o audiovisual, e da memória atribuída à ideia de comunidade da humanidade, e (c) um estudo experimental de arqueologia do sensível de imagens cinematográficas e audiovisuais presentes no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo. Dessa forma, pretende-se caracterizar a participação do cinema e do audiovisual no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo da Unesco, interrogando o conceito que o intitula, memória do mundo, e investigando a história contemporânea e a genealogia moderna desse projeto de constituição de arquivos universais da humanidade e do mundo, com base na compreensão da questão da tecnologia como cosmotécnica.
Plano de trabalho 1 – Cinema e audiovisual na Memória do Mundo (Unesco): políticas da memória do mundo
Desenvolvido por João Guilherme Batista Cardoso entre setembro de 2021 e agosto de 2022, com bolsa da UFBA.
Este plano de trabalho visa ao estudo do Programa Memória do Mundo (Unesco) no contexto das políticas internacionais da memória que se configuram no período posterior ao término da Guerra Fria. Para isso, articula-se uma interrogação teórico-filosófica do conceito de “memória do mundo” que intitula o programa da Unesco, um estudo sócio-antropológico da memória atribuída à ideia de comunidade da humanidade e um estudo experimental de arqueologia do sensível de imagens cinematográficas e audiovisuais presentes no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo. Para contribuir para o objetivo geral do projeto em que se insere, que é o de caracterizar a participação do cinema e do audiovisual no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo da Unesco, interrogando o conceito que o intitula, memória do mundo, e investigando a história contemporânea e a genealogia moderna desse projeto de constituição de arquivos universais da humanidade e do mundo, este plano de trabalho deve (1) contribuir para identificar e listar por meio de levantamento bibliográfico e documental, os arquivos, coleções ou produtos cinematográficos e audiovisuais presentes no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo, classificando-os com base nos seguintes critérios fundamentais (assim como em critérios adicionais que se revelem necessários durante a pesquisa): nacionalidade, tipo(s) de tecnologias e mídias associado(s), contexto(s) institucional(is) de arquivamento; (2) contextualizar historicamente um ou mais arquivos, coleções ou produtos cinematográficos e audiovisuais identificados e classificados, por meio de estudos de caso a serem elaborados de acordo com o plano de trabalho; (3) analisar um ou mais arquivos, coleções ou produtos cinematográficos e audiovisuais que tenham sido contextualizados historicamente, experimentando e desenvolvendo as propostas metodológicas associadas à noção de arqueologia do sensível e a abordagens ensaísticas por meio do audiovisual.
Plano de trabalho 2 – Cinema e audiovisual na Memória do Mundo (Unesco): cosmotécnicas da memória do mundo
Desenvolvido por Marina Moreno entre setembro de 2021 e agosto de 2022, com bolsa do CNPq.
Este plano de trabalho visa ao estudo do Programa Memória do Mundo (Unesco), considerando as condições tecnológicas em que se desenvolve, particularmente no que concerne ao lugar que nele ocupam as tecnologias da comunicação e informação do campo do cinema e audiovisual. Para isso, articula-se um estudo sócio-antropológico dos problemas das tecnologias da comunicação e informação, em especial o cinema e o audiovisual, investigando a possibilidade de que sejam compreendidos como cosmotécnicas (no sentido de Yuk Hui), e um estudo experimental de arqueologia do sensível de imagens cinematográficas e audiovisuais presentes no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo. Para contribuir para o objetivo geral do projeto em que se insere, que é o de caracterizar a participação do cinema e do audiovisual no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo da Unesco, interrogando o conceito que o intitula, memória do mundo, e investigando a história contemporânea e a genealogia moderna desse projeto de constituição de arquivos universais da humanidade e do mundo, com base na compreensão da questão da tecnologia como cosmotécnica, este plano de trabalho deve (1) contribuir para identificar e listar por meio de levantamento bibliográfico e documental, os arquivos, coleções ou produtos cinematográficos e audiovisuais presentes no Registro Internacional do Programa Memória do Mundo, classificando-os com base nos seguintes critérios fundamentais (assim como em critérios adicionais que se revelem necessários durante a pesquisa): nacionalidade, tipo(s) de tecnologias e mídias associado(s), contexto(s) institucional(is) de arquivamento; (2) contextualizar historicamente um ou mais arquivos, coleções ou produtos cinematográficos e audiovisuais identificados e classificados, por meio de estudos de caso; (3) analisar um ou mais arquivos, coleções ou produtos cinematográficos e audiovisuais que tenham sido contextualizados historicamente, experimentando e desenvolvendo as propostas metodológicas associadas à noção de arqueologia do sensível e a abordagens ensaísticas por meio do audiovisual.