O que este jogo de palavras a um tempo irônico e sombrio tem a nos ensinar sobre o estado de crise em que vivemos?
![Merry-Crisis-and-Happy-New-Fear.jpg](https://images.squarespace-cdn.com/content/v1/52c75179e4b076c49f5c5a2e/1402680512678-U4E0STWAYJDBQ88RUNAB/ke17ZwdGBToddI8pDm48kExIKRr6fYlA1CPI6hNusXZZw-zPPgdn4jUwVcJE1ZvWQUxwkmyExglNqGp0IvTJZUJFbgE-7XRK3dMEBRBhUpxnDHj9JHLTZu-ep74-XwTOhmdOsIjPK1nR2HyI9Ujh0505UKQWqCbfo9Mr9EdXl78/Merry-Crisis-and-Happy-New-Fear.jpg)
O Natal e o Ano Novo se aproximam, mas o horizonte do que se avizinha parece não trazer muitas novidades. Quando as tentativas de entrever o futuro revelam apenas várias modalidades da crise, é preciso saudar o porvir com a potência perturbadora de um jogo de linguagem: “Merry Crisis and Happy New Fear”.
A crise é um tema recorrente nas tentativas de compreender o mundo em que vivemos. No discurso dos poderosos, falar em “crise” é, frequentemente, uma justificativa para a manutenção ou para o aprofundamento de desigualdades que os privilegiam. No discurso do jornalismo, “crise” é a palavra-chave que define um número cada vez maior de pautas: a destruição do meio ambiente, os problemas da vida urbana, a economia globalizada etc. Não há nada fora da crise, e é preciso governá-la, dizem.
A forma como experimentamos a crise não é homogênea. Enquanto os discursos sobre a crise procuram conter seus sentidos numa representação mais ou menos precisa de seu alcance espaço-temporal e de seus efeitos sócio-históricos, os 99% atravessam a crise como experiência cotidiana, comum, trivial, efetivamente ingovernável, e deslocam os discursos dominantes sobre a crise por meio de uma série de procedimentos de protesto contra a forma como a crise é governada.
Quando a capa da revista Vavel, em seu especial de Natal de 2007, mostrou a fotografia abaixo, de autoria desconhecida, a frase ali registrada talvez não tivesse alcançado, ainda, a disseminação atual.
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Depois disso, “Merry Crisis and Happy New Fear” tornou-se uma espécie de slogan das manifestações que tomaram as ruas da Grécia em 2008, além de tornar-se objeto de apropriação por parte dos movimentos de ocupação em diversas cidades ocidentais, que comentaram a frase em seus blogs, a reproduziram e a difundiram, também em suas manifestações.
![christmasathens4.jpg](https://images.squarespace-cdn.com/content/v1/52c75179e4b076c49f5c5a2e/1402680590083-S08OM0OF6PRSOTDG9GHM/ke17ZwdGBToddI8pDm48kL1dzoyH1GHmfQTxej42d8lZw-zPPgdn4jUwVcJE1ZvWQUxwkmyExglNqGp0IvTJZamWLI2zvYWH8K3-s_4yszcp2ryTI0HqTOaaUohrI8PIWnyE1Wgj6azpYKYxQjmmz_mQjopW81nogj2vVzGxvJ0KMshLAGzx4R3EDFOm1kBS/christmasathens4.jpg)
![Merry-Crisis-and-Happy-New-Fear-2.jpg](https://images.squarespace-cdn.com/content/v1/52c75179e4b076c49f5c5a2e/1402680612605-DKOC9IQ7YVNSRLNLZSPD/ke17ZwdGBToddI8pDm48kM4tqwWhiGlScVBjOt7WCxdZw-zPPgdn4jUwVcJE1ZvWQUxwkmyExglNqGp0IvTJZUJFbgE-7XRK3dMEBRBhUpyqcs-4j9YJkTE7ZVX5xMmH4is1UhHPZBfEH4KAJ9TRnZeBsgmZR6jAkQF0MT4toNU/Merry-Crisis-and-Happy-New-Fear-2.jpg)
![e0205478_1473728.jpg](https://images.squarespace-cdn.com/content/v1/52c75179e4b076c49f5c5a2e/1402680641315-EY68X9K811WK9LPTD4LM/ke17ZwdGBToddI8pDm48kFiiHPObj14fEaBJE6G7GdZZw-zPPgdn4jUwVcJE1ZvWQUxwkmyExglNqGp0IvTJZUJFbgE-7XRK3dMEBRBhUpxsAAMOBhOKP8rU7t2u19hN8taLgaDUJ2c9XdfLT3EG1e-ekEyv_LRu0q8kUgfW5k8/e0205478_1473728.jpg)
Lembrar das palavras “Merry Crisis and Happy New Fear” e, sobretudo, das inúmeras imagens em que elas se fizeram visíveis é uma ocasião para recordar que a crise permanece sendo a experiência comum dos 99%, em meio às oscilações da economia global, às transformações das paisagens urbanas, à consolidação da consciência ambiental como consciência privilegiada da destruição.
Diante da proximidade do Natal e da passagem de ano, sob os ecos dos protestos que tomaram as ruas das principais cidades brasileiras em junho de 2013, em meio às iniciativas cada vez mais explícitas de institucionalizar o genocídio indígena no Brasil (apesar das importantes tentativas de resistência), o jogo de linguagem dessas palavras permanece contundente. De fato, o mundo em que vivemos ainda está invertido.